Alterar fotos para encenar realidades
inexistentes é prática frequente de alguns fotógrafos. Essa alteração pode ser
técnica, quando se manipula as imagens adulterando os conteúdos no processo de
impressão, ou pode ser cênica, quando se mexe na cena que se vai fotografar
sugerindo-lhe uma cena inexistente, mas de maior teor dramático e impacto. No
excepcional O Instante Certo a escritora Dorrit Harazim nos apresenta alguns
exemplos de fotógrafos que se notabilizaram para história com grandes
trabalhos, mas que também eram manipuladores desavergonhados. Durante a Guerra
Civil americana os fotógrafos Alexander Gardner, Mathew Bradey, Timothy
O´Sullivan e Andrew Joseph Russel constituíam o quarteto que alimentava os
jornais de imagens dos horrores do fronte. Não raro estes fotógrafos, escreveu
Dorrit, “ajeitavam com a mão a realidade, recriando cenas para lhes insuflar
mais impacto ou para compensar a limitação tecnológica e a dificuldade de
chegar ao local no momento da ação”. Como algumas câmeras exigia exposição de
até oito minutos “tornou-se pratica não pecaminosa recriar cenas das batalhas
já ocorridas”. As imagens eram vendidas ao público como flagrantes reais da
carnificina. Outro grande manipulador era o norte-americano Edward S. Curtis.
No monumental registro das tribos indígenas sobreviventes aos massacres que
dizimaram nações inteiras de povos nativos Americanos, ele tomava o cuidado de
apagar dos registros as marcas da modernidade e do contato do nativo com o
colono que pudesse macular o seu projeto de mapear índios autóctones. É celebre
uma de suas fotografias em que ele apaga do interior de uma tenda de um velho
líder indígena um relógio que estava ao lado dos índios e sugeria o contato dos
índios com os homens brancos. Há também outra forma de manipulação. Durante o
regime do “Grande Timoneiro” a Rússia Comunista viu uma forma de manipulação
que se tornou comum. Membros do partido comunista Soviético eram pouco a pouco apagados das fotos oficiais com
Stalin à medida em que se tornavam desafetos do regime. Há uma foto famosa que
mostra esse processo de apagamento da história. Na primeira foto vemos: Nikolai
Antipov, Stalin, Sergei Kirov, Nikolai Shvernik, e Nicolay Komarov. A foto foi
feita em Leningrado em 1926. Décadas depois os lideres à volta de Stalin foram
pouco a pouco sento apagados das fotos oficiais até restarem apenas Stalin e
Sergei Kirov. Hoje isso seria mais difícil de acontecer, mas há uma forma de
manipulação que estar em curso e ganha mais e mais adeptos. Há sempre novas
formas de manipulação. Agora os líderes decidem quando, onde e como são
fotografados. Todos eles têm seus fotógrafos oficiais e não se deixam
fotografar fora do script determinado por seus marqueteiros e publicitários.
Uma imagem mal intencionada ou um deslize nas encenações programadas pode por a
baixo todo um trabalho de construção de imagem pública. Ninguém quer ser
apanhado em flagrante de si mesmo. As imagens construídas pelas cabeças dos
marqueteiros são as únicas admissíveis pelos políticos atualmente. Assim sendo, os políticos passaram a ser os donos de suas próprias imagens não deixando
margem à interpretações e miradas indecorosas de fotógrafos não alinhados
aos seus propósitos.
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