Vincar a memória

Foto: Sally Mann, Deep South

Há mais de 20 anos deixei a Paraíba. Nunca mais retornei às cidades que me viram miúdo aprendendo a falar e a andar. Não foi por não querer, ou por falta de oportunidade, que não retornei à minha terra natal. Foi por medo.

Há muito botei na cabeça que se um dia eu retornar às cidades que foram a levedura de minha infância, estarei ameaçando com isso a imagem afetiva que, desde o meu último dia naquelas terras, eu trago na memória. E são ternas. Lindas e amáveis essas imagens.

Um sentimento estranho me faz crer que posso ser traído por uma verdade incomoda e descobrir que as belezas que um dia eu julguei ter vivido não passavam de alucinações de uma mente sequiosa de ilusões capazes de tornar o presente suportável, por já ter vivido um passado satisfatório. Seria duro demais perder a ilusão.

As emoções que produziram aqueles momentos são irrepetíveis. Só por isso é sempre grande o impulso que nos surge para cristalizá-los tornando perenes as emoções que produziram instantes líricos. Voltar lá seria o mesmo que viver de outra maneira aquele ambiente comprometendo assim a minha lembrança de momentos inesquecíveis.  

Não sinto o mesmo temor a outros lugares. Ao contrário sinto até vontade de rever lugares que há muito tempo visitei. Goiás Velho, Veneza, Caldas Novas, Jundiaí... Meu medo é o de retornar às paisagens da infância. Temo que elas se desmoronem sobre a novidade que se me apresentará.

Nenhum comentário: