Diretor do espetáculo Baianidade Baiana comenta a crítica de Téo Júnior

Téo Júnior, jovem revelação da crítica de teatro, escreve ocasionalmente no blog "Navegantes ao Mar" e no jornal Cinform, de Aracaju. Suas publicações são quase sempre relacionadas ao teatro e, esporadicamente, de cultura de uma forma geral. O espetáculo Baianidade Baiana, ao passar por Caetité, foi vista por Téo e ele publicou sua análise aqui no blog. O diretor Alberto Damit, ao tomar conhecimento da crítica, escreveu a respeito. Como o objetivo da blog "Navegantes nao Mar" não é o de destacar uma opinião, apenas, como sendo a verdadeira, e sim fomentar as discussões, publicamos na íntegra o texto de Damit.

"Li com satisfação sua crítica a respeito de nosso Baianidade Baiana, acho importante e até nobre a discussão quando ele resulta de estudo ou até mesmo observação de uma obra artística. Acredito que o teatro tem este poder, fazer pensar e com isso melhorar nossas atitudes. Agradeço a atenção.

Porém acho necessário esclarecer algumas colocações sobre suas críticas:

Baianidade Baiana utiliza-se do Stand up e do besteirol para elucidar os devaneios preconceituosos de quem só conhece a Bahia pelo cartão postal. Durante quase dois anos, pesquisamos os motivos que fazem os turistas folclorizar e muitas vezes discriminar o jeito de ser de nos Baianos.

Somos uma Cia. que estuda o comportamento do preconceito, conhecemos bem sua manifestação. Fazemos teatro popular com o objetivo de atender a uma plateia que compreende e consome comédias, porém é comum encontrar resistência de uma pseudoelite que acredita que o teatro necessita ser construído a partir de modelos utrapassados, distanciado e sem a mácula do riso. Não é isso que achamos. A arte é diversa, assim como os gêneros do teatro, não se pode diminuir esta ou aquela manifestação artística que seja sustentada pela concordância do risos ou dos plausos, e não compreender esta tendência é quase um crime.

Me chamou atenção o fato de uma pessoa culta escrever que nosso tiíulo Baianidade Baiana é redundância. A Baianidade é presente em diversos lugares do Brasil, a Baianidade Baiana esta sim somente aqui.

Para lembrar: *Licença poética é uma incorreção de linguagem permitida na arte. Ela é permitida para que o escritor tenha toda a liberdade para manipular as palavras, para que ele possa passar tudo o que pensa ao leitor. Em sentido mais amplo, são opiniões, afirmações, teorias e situações que não seriam aceitáveis fora do campo da literatura.

*"Sistema de consulta interativa - Estadão", p. 171. Editora Klick. São Paulo (1995)

A respeito de sua comparação com A Praça é Nossa, ficamos lisonjeados uma vez que este programa sempre se destacou pela diversificação em seu humor. Nesses 24 anos, foram produzidos mais de mil programas inéditos. Sem contar que já desfilaram pelo banco da praça mais de 120 artistas, entre humoristas e comediantes, que protagonizaram o respeitável número de 250 personagens.

Baianidade Baiana obteve excelentes críticas em Minas e no Espírito Santos, e foi convidado para uma temporada de três meses no Teatro Candido Mendes em Ipanema no Rio de Janeiro em 2012.

Por fim achamos que diversidade nos seus aspectos mais amplos deveria ser exercitada como um todo pela sociedade e não apenas dentro da sala de aula ou num blog. A diversidade é um princípio humanista para conseguirmos construir um mundo onde possamos viver com mais respeito, compreensão e paz.

As pessoas com elevado grau de compreensão sobre a diversidade cultural, em geral têm comportamento mais tolerante e contribuem para menor ocorrência da violência e as manifestações racistas.

Devemos todos ajudar a construir um mundo com mais DIVERSIDADE.

Alberto Damit
Diretor do espetáculo


ESPETÁCULO DIVERTIDÍSSIMO ABORDA INFERNOS PARTICULARES


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De fato, todos nós temos sérios problemas sexuais

Téo Júnior *

Se existe um assunto que o teatro soube explorar à exaustão, com certeza é o sexo. Desde os gregos (“Édipo-Rei”, por exemplo, realçou o incesto, terrível e chocante, porque relacionado a um tabu social), passando pela crise e a monotonia do casamento, onde os cônjuges, já saturados, cogitam sem qualquer disfarce até mesmo o adultério – circunstância que Albee compôs como ninguém – até chegarmos aos instintos mais baixos do ser humano – leia-se devassidão – verificados nos textos de Genet e no universo quase sempre pantanoso de Nelson Rodrigues, com as “bonitinhas, mas ordinárias” da vida.

Desde os tempos inenarráveis de Calígula, até os dias que correm, a humanidade jamais parou de fazer sexo – tanto para fins de procriação ou como um mero passatempo. “Senhor, concedei-me a virtude da castidade – mas não agora!”, escreveu Santo Agostinho.  

Em “Todo Mundo tem Problemas Sexuais”, de Domingos Oliveira e Alberto Gondim, são abordados esses infernos no tocante à intimidade das pessoas. E aí entramos num campo minado – e sombrio, já que a sexualidade sempre acompanhou a vida dos indivíduos considerados saudáveis, e cuja finalidade é proporcional prazer e bem-estar, mas que acaba se convertendo num fardo. A lista é extensa e penosa: surgem o fantasma da impotência, homossexualidade, traição, os encontros na internet que quase sempre culminam em frustração, sexo grupal (sic!) e um repertório enciclopédico de palavrões que faria a alegria de uma Dercy Gonçalves.

A peça resulta interessante porque, dividida em 6 quadros, destaca situações que seriam consideradas dramáticas numa primeira instância, para no palco elas se transformarem em objeto de comicidade. Embora mergulhados em suplícios aterradores, paradoxalmente manifesta-se nesse povo o desejo incontrolável de prosseguir sua atividade (ou tara) sexual.

Em cena, apenas uma cama por onde todos os personagens passam. Há tipos demasiadamente pitorescos, como o baiano safado (Eduardo Albuquerque) da 1º. quadro que se apaixonou pela colega farmacêutica (Mariana Moreno; não se sabe qual deles é o pior) e uma protestante ninfomaníaca (Cida Oliveira) que teve a cara de pau de trair o marido na própria casa, com o patrão dela, gordo e bêbado.  

Não diria que o espetáculo fora maravilhoso, não há a necessidade de exagerar, mas fora bem trabalhado. Os textos ficaram claros e estabelecidos de modo cuidadoso; uma produção caprichada, os atores estavam seguros de seus papéis e as soluções dramatúrgicas para temas tão variados foram inteligentemente desenvolvidas. Em suma, uma peça divertidíssima e muito responsável.

 O PÊNIS QUE FALA

Mas, caminhando para o final, o espetáculo desabou num precipício: eis que surge em cena, inesperadamente, um sujeito trajando roupão e uma touca cor de rosa, de um excepcional mau gosto, dizendo-se o personagem “mais importante” da história e reivindicando o direito de “se manifestar”. Identificou-se como sendo o pênis. (Ah, Meu Deus...). É impressionante o festival de besteira que assola o teatro e que eu sou obrigado a aturar. Onde já se viu isso? Então, o órgão masculino narra sua “via-crúcis” e, ironicamente, fora o quadro que mais agradou ao público, a julgar pelas gargalhadas quase que histéricas que se ouvia. Num determinado momento, ele admite que Fernando Gomes não soube como terminar a apresentação e pediu que ele falasse o que quisesse. O recurso que os sábios de outrora classificaram de “deus ex machina” pôde muito bem ter funcionado nas tragédias gregas, mas em “Todo Mundo” foi sinceramente catastrófico.  

Ora, se o diretor não soube encerrar dignamente a peça, a incompetência é dele. Salvou-se, além dos mencionados, o desempenho de Kadu Veiga e “Todo Mundo”, exibida no feriado do dia 15 atingiu uma audiência que raras conseguem: todas as cadeiras do Teatro Tobias Barreto foram ocupadas. Durou 2 horas.

 *É crítico de teatro. Contato: junior_teo

Publicado no jornal Cinform do dia 21/11/2011, pg. 5 

"A pele que habito": um filme que merece ser visto


Téo Júnior*
Aracaju

O azul da camisa de Banderas dominando a tela, armas que cumprem sua função elementar: disparar, pessoas presas a cadeiras, muito sexo - como não? - e a discussão sobre os limites e a ambição de médicos que se pretendem revolucionários, ainda que atropelando qualquer espécie de ética. Até o mais incauto indivíduo, sem dificuldade, identificaria o criador desse enredo: Chama-se Pedro Almodóvar e o filme em questão é "A Pele que Habito" (La Piel que Habito, Espanha, 2011, R$ 18 o ingresso).

Resumindo: o filme que dura 2 horas possui o magnetismo e o vigor que faltaram ao último trabalho de Pedro, "Abraços Partidos". Porém, lá estão o suspense e o drama tão comuns no universo almodovariano, sobretudo verificadas em suas obras-primas. Não possuo competência pra fazer crítica de cinema, mas arrisco dar uma opinião enquanto fã do cineasta - o único diretor que acompanho a carreira mais detidamente. Diria que "A Pele que Habito" não seja a joia da coroa da filmografia e Pedro, isto é, não chega a ser uma obra genial, mas é um trabalho interessante.

Antonio Banderas, como sempre, surpreendendo numa atuação que assinala sua experiência e sua maturidade como o grande ator que é. Estranhei Marisa Paredes, quase que não a reconheci. Meu Pai Do Céu, como Marisa está velha! Por um momento, pensei se tratar da atriz Clayde Yáconis, já na casa dos 90. O filme , entretanto, decorridos 125 minutos, pareceu que ainda tinha muito a dizer. Há algumas referências ao Brasil, inclusive um dos personagens diz claramente: "Estava com saudade". Lembro que "saudade" é a única palavra que só existe na língua portuguesa.

É uma obra recomendável.


*Téo é o mais ilustre colaborador desse blog. 

Os inconvenientes indispensáveis

Almada Negreiros (O prazer de ler)
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O escritor Mario Quintana, mestre da literatura de miudezas, escreveu: "Há duas espécies de livros: uns que os leitores esgotam, outros que esgotam os leitores". Desconfio dos primeiros, por isso, prefiro os segundos. Por temperamento, tendo às leituras que desafiam os leitores. Nessas, seguramente, eu poderei encontrar o que falta naquelas; coragem em dizer algumas verdades incontornáveis. Nenhum livro, que recentemente saltou das listas dos mais vendidos ao colo dos leitores, foi capaz de contrariar as expectativas ou de frustrar os anseios dos seus leitores, que por isso, lhes são muito gratos. Os que esgotam os leitores não têm a mesma sorte, nem por isso estão desconfortáveis. Há desconforto maior, creio eu, em viver a pressentir e segregar os inconveniente e as desilusões do mundo, do que ter a sua certeza.


Pobre Europa

.(revoltas populares na Grécia)

Na eminência de um colapso na economia da zona do euro, os lideres políticos, até aqui, não conseguiram encontrar alternativa à crise, que não tenha que passar pela socialização dos prejuízos cometidos pelos banqueiros e burocratas de plantão. Mais uma vez a população terá que apertar o seu já asfixiante orçamento para resgatar a máquina econômica do fundo do poço. As medidas de austeridades para Grécia, Portugal, Espanha, Irlanda e em breve Itália, punem quem não tem nada haver com a delinquência financeira que graça no mundo capitalista. As propostas de austeridade pesam, exclusivamente, sobre os ombros dos trabalhadores e da população em geral. Entre as medidas, apontadas pelo FMI como única solução para crise, estão: aumentos dos impostos, cortes nas despesas do Estado, demissões em massa, aumento da jornada de trabalho e privatizações. Medidas ainda mais estranguladoras foram ventiladas. Um duríssimo golpe naqueles que têm que lidar diariamente com as incertezas da vida e um golpe fatal naqueles que ainda nem começaram a lidar com elas. Em meio a todo esse arrocho não se ouve noticias de que haverá diminuição do número de parlamentares, redução dos salários dos políticos, fim dos privilégios aos dirigentes, punição aos desastrados e gananciosos agentes financeiros que manipulam a economia a seu bel-prazer e segundo os interesses das corporações financeiras, que deram inicio a tudo isso. Os privilegiados continuam intocáveis, a massa, chafurdando na lama. Dessa maneira, as propostas de austeridade não são equilibradas na distribuição dos sacrifícios para salvar a economia do maior bloco político do mundo; nem qualquer outro país que esteja em risco.  A mim essas medidas, da forma que estão sendo conduzidas, parecem mais uma extorsão. Em não sendo a população produtora, os culpados desses maus feitos, que assolam as economias europeias, não tem razão os governantes de mandarem a conta pra eles pagarem. Quem deve pagar pelo delito, são os agentes financeiros, os especuladores, os mercados exploradores e toda essa récua, que dirige sem nenhuma habilitação os interesses do povo. Como tudo que está ruim, pode piorar, fala-se em reformas ainda mais profundas e vampirescas, como se a população trabalhadora já não estivesse sendo severamente molestada em seus direitos. Alguns políticos, aproveitando a ocasião em que estão sendo discutidas (discutida é uma palavra estranha nesse contexto, o que estamos vendo na verdade é um massacre contra os direitos democráticos) medidas para contornar a crise, já pensam em incluírem no pacote de estupro aos trabalhadores, propostas que mexem com o tempo de contribuição para aposentadoria. Uh! Espertos, não? Com as privações a que estão sendo submetidos, os jovens europeus não precisarão se preocupar com a aposentadoria, e sim em sobreviverem a essa tormenta financeira.

Ondjaki: a poesia da aprendizajem

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Anarquizar as palavras. Remodelar a língua entortando-a até o estado poético. Esse é o esforço empregado por Ondjaki (1977), escritor angolano radicado no Brasil, em seu mais novo trabalho, Há Prendisajens com o xão (o segredo Húmido da lesma & outras descoisas) livro que acabo de ler com grande prazer. Nesse percurso de aprendizagens, Ondjaki procura desvendar os segredos guardados pelas palavras e explorar todo o seu potencial poético. Recriando-as anarquicamente, ele apanha as lições de Manoel de Barros  de que a melhor maneira de poetizar as palavras é adoecendo-as ou infringindo os códigos para renovar os sentidos e revigora as palavras, vitimadas pelo engessamento das convenções. Os sinais dessas prendisajens manoelinas estão por todo o livro. As referências a Manoel de Barros vão desde as insistentes imagens que privilegiam as insignificâncias do mundo: apetece-me des-ser-me;/reatribuir-me a átomo.... (CHÃO). Borboleta é um ser irrequieto./para vestes usa pólen/ tem um cheiro colorido.... (PARA VIVENCIAR NADAS). Para acumular dores/o mais das vezes/ bastou um desamor. (QUE SABES TU DO ECO DO SILÊNCIO?);  à linguagem perpassada pela torção que lhes aniquila a alienação imposta pelo uso cotidiano: a despalavreação/ pode acrescer de uma vida... ou ainda apetece-me chãonhe-ser-me.... Nas extraordinárias imagens que surgem desse exercício lúdico com as palavras reside o maior encanto desse livro. 

lágrima
é uma sensação que escorrega.
mundo está seco de coisas e trans-sensações
assim a lágrima presta-se
a desressequir o mundo.
(...)

(LÁGRIMA, GOTA, LÁGRIMA OU: TODAS DESPEDIDAS DO MUNDO)


(...)
Solidão é uma esteira
Onde se evite cochilar.
(...)

(REENCONTRO COM GOTAS)

O inchaço do coração
Facilita o despalavrear.
A liberdade pode advir
De uma veia.
Com sangue também
Se reescreve a vida.
O suicidado foi um apressado
Para desconhecimentos.
(...)

(INSCRIÇÃO)

Ao implodir todo formalismo, Ondjaki cria uma poesia marcada pelo insólito onde a violação das convenções linguísticas, descondicionam o olhar do leitor, abrindo-o à novas e impressionantes visões sobre o mundo. Ondjaki diverte-se com as palavras, e diverte ainda mais o leitor, criando mundos fabulosos onde os limites para fantasia e à criatividade simplesmente se recusam em existir. A obediência às normas e às convenções são coisas incompatíveis com a poesia desse angolano de temperamento brasileiro.

Lição


(via: no queen)

Desajuizado


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À vista, pois, dos maiores argumentos, nenhum político brasileiro cede à verdade e se rende à moralidade. A vaidade, a imoralidade e a tentação pelo dinheiro fácil, são coisas que não se arrancam a força dos argumentos e dos apelos populares. Antes, infiltra-se no mais fundo da alma desses homens onde esquivasse dos golpes da opinião popular, da justiça e dos interesses coletivos, fazendo morada perpetua. Os maus costumes são uma tradição dos homens da política nacional. Tenho, porém, malgrado todas as opiniões em contrário, esperanças de que um dia ainda responderemos aos achaques políticos com a coragem que hoje nos falta. Até lá Tiriricas, Arrudas, Rorizes, Godoys, Caraíbas e outras excelências, continuarão desmentindo minha boa vontade e fazendo de minhas opiniões futuras um desplante.