NAVEGANTES AO MAR RECOMENDAM:

__________________________________

Toda Nudez Será Castigada, na montagem do “Armazém Companhia de Teatro”, RJ, na apresentada no dia 07/07/2007, no “Teatro Dom Silvério” do Chevrolet Hall, Belo Horizonte.

Por Teo

Como teatro é minha grande paixão, vou indicar cinco das peças que mais me marcou, de cinco gigantes do teatro brasileiro.

1. TODA NUDEZ SERÁ CASTIGADA (1965), Nelson Rodrigues

Depois de ficar viúvo da única mulher que amou na vida, o milionário Herculano passa a viver um grande dilema: a paixão avassaladora pela escachada Geni, provavelmente a prostituta mais célebre da dramaturgia brasileira. Os problemas são o irmão, um parasita que vai chantagear a moça – já sua conhecida – a tirar proveito da situação, um filho adolescente fresco, que vingará o pai porque nunca permitiu que este se relacionasse com mais ninguém e as tias (sempre elas), que no teatro rodriguiano só servem para pôr mais lenha na fogueira. Só na cabeça de um Nelson Rodrigues uma história dessa dimensão poderia ser tão extraordinária. “Toda Nudez” é uma de suas obras-primas. Adaptado para o cinema em 1973, fez com que d. Darlene Glória fosse mundialmente conhecida, no papel de Geni. É o filme mais lembrado de Arnaldo Jabor e segundo a crítica, a melhor versão de Nelson para as telas. José Lino Grunewald escreveu, à época, uma crítica em que era plenamente favorável ao filme, embora lamentasse os cortes impostos pela censura. Memorável.

2. DOIS PERDIDOS NUMA NOITE SUJA (1967), Plínio Marcos

Imagine aí dois camaradas completamente diferentes, arruinados, lascados, que são obrigados a dividir o mesmo quarto, de quinta classe. O problema é que eles se odeiam e as chantagens, as pirraças, as agressões provocarão as reações mais surpreendentes. E em se tratando de outro maldito, Plínio Marcos, já se sabe que vem encrenca por aí. Escritor do submundo, dos marginais, recebeu maior influência de Nelson Rodrigues, a quem Plínio considerava “um poeta do teatro”. Um par de sapatos, um alicate etc., serão quase que protagonistas dessa peça de apenas 2 atos. O texto, porém, é muito mais vigoroso do que o filme homônimo, que trouxe Débora Falabella e Roberto Bontempo, como os protagonistas, arruinados (e nos Estados Unidos). No texto original, moram numa espécie de periferia e são, repito, dois homens, Paco e Tonho.

3. O BEM-AMADO (1968), Dias Gomes

O maior dramaturgo baiano consagrou-se com a excepcional “O Pagador de Promessas”, grande sucesso do Teatro Brasileiro de Comédia, em 1960. Mas as histórias da lendária Sucupira e do inescrupuloso Odorico são de rolar de rir, o que me obriga a incluí-la nessa lista e é, na minha opinião, o melhor texto do teatrólogo, morto em 1999. Ferreira Gullar assina um prefácio magistral na edição publicada pela Ediouro. Além desse texto, uma introdução do próprio Dias, explicando que imaginou essa “farsa-patológica” em 9 quadros, depois que leu no jornal uma reportagem na qual um político qualquer prometeu que inauguraria um cemitério de andar. Em Sucupira, o prefeito está doidinho para inaugurar um, mas o problema é que não morre ninguém. Quando se descobre que nas redondezas há um sujeito nas últimas, todo o esforço é válido para que a obra finalmente saia. Ninguém deve morrer sem ler “O Bem Amado”. Virou novela e seriado, na Globo. Quando a direção achou que a história já havia cansado (de 1980 a 1985 no ar) e que teria de acabar, Jorge Amado enviou um telegrama diretamente a Roberto Marinho, para que ele reconsiderasse. Não teve jeito.

4. AUTO DA COMPADECIDA (1956), Ariano Suassuna

Ariano Suassuna se ressentia da “Compadecida” ser conhecida do grande público somente depois de virar filme, em 1999. Ela existia há 40 anos. A malandragem, a esperteza, a ingenuidade dos sertanejos estão retratadas nas figuras de Chicó e João Grilo. Protestante convertido ao catolicismo, Ariano via uma beleza magnífica na fé católica, mas não poupou a Igreja de seus abusos, como na disputa do padre contra o bispo, por dinheiro. João Grilo passará pelo julgamento e topará com Jesus de um lado e o Diabo, do outro. O personagem entre a cruz e a espada. Uma sátira à usura, à hipocrisia e à bajulação aos poderosos, representados na figura do coronel Antonio Moraes. Henrique Oscar, crítico, conta que o mérito do autor nesta peça foi “elevar o regional, o local ao universal”. É baseada na cultura popular, “nas histórias que o povo conta” (cordéis), mas o dramaturgo paraibano recebeu influências de Plauto, Gil Vicente, Lope de Vega etc. Coisa finíssima.

5. O BOI E O BURRO NO CAMINHO DE BELÉM, (1953) Maria Clara Machado

Nossa maior autora teatral infantil. Entre suas grandes peças, eu aponto “A bruxinha que era boa” e “O Rapto das cebolinhas”. Ela dá o encantamento que toda criança necessita. Todos os grandes críticos que li a engrandecem. De seu teatro, o “Tablado” saiu muita gente de peso. Essa historinha deve ser representada no Natal. O boi e o burro, nessa “farsa-mistério” em 1 ato, se apavoram, ao constatarem que no lugar imundo onde estão, descerá o menino Jesus. Os dois, às pressas, vão organizar o ambiente para receberem o Menino com a dignidade que eles podem dar. Napoleão Muniz Freire, nome de alto relevo de nosso teatro, participou como o Pastor. O deslumbramento é intenso apenas lendo. Vista, então, deve ser encantadora. O pano cai com “Noite Feliz”. Emocionante e divertida sem ser superficial.

__________________________________

5 POR 4

Navegantes ao Mar convida 3 de seus mais ilustres colaboradores, para elencarem 5 obras que, mudaram sua relação com a literatura e com o mundo. Adiantamos que essa é tarefa para cardíacos. Quem ama literatura, dificilmente restringe, a um rol tão pequeno seu gosto pessoal. Disso todos sabemos. Porém, mesmo difícil essa não é tarefa impossível. Há sempre um lugarzinho especial para esse ou aquele autor em nossa vida. Com isso pretendemos conservar acessar ou botar a prova nossa relação com essas cinco obras. Quem sabe elas não se mostrem efêmeras ou, pelo contrário, mais vivas do que nunca, quando olharmos para essa enquête daqui a alguns anos. Para tanto, elegemos como juiz de nosso teste o melhor e mais sábio dos julgadores, o tempo. Esse senhor que nasce conosco e segue-nos até o fim. O primeiro há escrever suas cinco obras fundamentais é meu amigo e irmão Teo Júnior. Os outros, Teo Poeta e Eudes Marciel julgarão a sua própria hora de contribuírem para o site. Muito obrigado a todos.

A volta da voz despida de João Cabral de Melo Neto


Em que pese o seu proverbial apego a razão consciente na hora de fazer poesia - algo profundamente estranhado por quem só conhece os lacrimosos versos de um poeta romântico- a obra de João Cabral de Melo Neto, volta a ser reeditada, dessa vez pela editora Alfaguara. Já não era sem tempo. Desde a partida do nosso maior poeta, em 1999, apenas algumas edições de Morte e vida Severina e outro poemas para vozes, haviam sido editados, pela detentora dos direitos de publicação, a editora Nova Fronteira.

Agora, desse segundo semestre até o ano que vem as livrarias de todo Brasil terá novamente em suas prateleiras os versos pungentes e corrosivos do autor de Uma faca Só Lâmina. O primeiro dos títulos, que abre a série, já está nas livrarias, e se intitula O Artista Inconfessável. Um decalque do título de um de seus poemas do livro Museu de Tudo, obra de 1974.

Trata-se de uma reconha (já que não existe nada inédito na obra do autor) dos poemas que “mostram uma faceta mais familiar e intimista” do poeta; anuncia a orelha do livro. Nada mais irônico. A vida inteira João Cabral lutou por enxugar da poesia os excessos subjetivos que a tradição romântica popularizou. Isso lhe valeu, erroneamente, o título de poeta hermético, árido, e outros tantos adjetivos equivocados. O que de certa forma denuncia, a meu ver, certo estado de comodismo e inércia de alguns leitores, que não souberam reconhecer que a poesia de João Cabral, além de rica é desafiadora.

Seu talento, posto a prova, contra o servilismo dos que só fazem poesia inspirados por uma voz inconsciente, alargou as fronteiras do oficio poético, ao assumir o desafio maior de fazer poesia à contra pêlo, “seu perfumar a rosa e sem poetizar o poema”. Obra de quem vive inteiramente seus ideais e convicções intransigentemente, para bem de seu oficio.

FILHOS, CONFORMEM-SE: SEUS PAIS NÃO FORAM PIORES DO QUE O DE FRANZ KAFKA


“Acho Kafka mais difícil de ler do que Joyce”. O comentário poderia intimidar a uns, menos a mim, por mais que tivesse partido de Paulo Francis, em seu “Diário da Corte”. Acabei de ler um dos textos mais significativos e agradáveis da literatura mundial, embora o autor não tivesse a pretensão de ser uma carta particular dessa um escrito literário – e, por isso mesmo – fascinante. Trata-se das “Cartas ao Pai”. Foram 50 folhas escritas no espaço de dez dias. É um texto pequeno. Transformado em livro, juntamente com pequenas biografias, posfácio etc., não chega à página 100.

Eu paro um momento e começo a olhar pra Kafka, na foto da primeira orelha. Para os padrões de 1924, até que não era de se jogar fora. Aquelas orelhas emborcadas lhe conferiam um certo, digamos, charme. Mais parecia um menino carente e sofrido. Antes de ler o livro, pensei olhando sua foto: “Não deve ter faltado mulher pra esse cara”. Pois não faltou, mesmo. Duas moças topariam se casar com ele, no duro, caso a besta do pai dele permitisse.

Alguns podem achar ser esta uma carta rancorosa. Não parece. É toda a verdade e todo o cinismo do pai demonstrado de maneira sucinta e didática. Um texto leve e muito bem escrito. Estranha, porém, a maneira como ele se refere ao pai, sr. Hermann Kafka. Ora “querido”, no início – mas no decorrer da carta, sempre “você”. Kafka chega a dizer que se sentia um mané perto do pai. “Da sua poltrona você regia o mundo. Sua opinião era certa, todas as outras extravagantes”. Bruto, irônico, com um humor cáustico, a personalidade do pai é traçada em pormenores que prendem o leitor do começo ao fim. Humilhou-o, porém, uma atitude do pai: um belo dia, este jogou-lhe na cara que outrora havia passado privações, que trabalhara dia e noite, para dar-lhe um sustento digno, enquanto Kafka desfrutava desse trabalho, “vivendo à larga”. É duro ou não é?

Medo – Toda a carta fala do medo que Kafka, desde cedo, sentia e que o acompanhou por toda a vida. O pai sabia disso e quis descobrir a razão. A resposta está logo nas primeiras folhas. Talvez a grossura do pai quisesse transferir a ele segurança. “Você só pode tratar um filho como você mesmo foi criado, com energia e cólera. (...) Nesse caso, isso lhe parecia adequado, porque queria fazer de mim um jovem forte e corajoso”. Resta agora saber se isso foi bom para o filho. Os pais geralmente fazem as piores m... acreditando serem atitudes excelentes aos filhos. Só que não são coisíssima nenhuma.

Vergonha e casamento – Proprietário de uma loja, o patriarca tratava a todos os empregados – sem exceção – como cachorros pulguentos. “Isso muito me envergonha”, escreveu o filho. A capacidade de sentir a dor do outro o fazia sofrer. Foram inúmeras ocasiões em que o pai expôs Kafka às decepções, muitas vezes em público. Pois bem: Kafka achava que um homem tem de ter mulher e filhos e sossegar. Engraçou-se com duas moças. Noivou, desnoivou, ficou com outra, gostou de uma outra etc., mas o pai jamais quis um casamento. Outro dia, esse bronco ofendeu uma de suas noivas porque ela era de condição inferior à deles. “As duas moças foram de fato escolhidas por casualidade, mas extremamente bem escolhidas”, Kafka disse.

Como meu “pai” Nelson Rodrigues, o grande escritor fora tuberculoso, internou-se num sanatório e lá mesmo morreu, com 40 anos de idade. Vale a pena conferir sua obra, das mais inquietantes da literatura universal, como “O Processo” e “A Metamorfose”. O único sentimento que tenho é saber que a carta jamais fora enviada, por razões até hoje no campo das hipóteses. Faleceu em 1924 e seu túmulo se encontra num cemitério judaico em Praga, capital de República Tcheca e ponto final.

Lira dos Oitenta e Cinco anos

No último dia 16 o escritor português José Saramago completou 85 anos de vida. Na esteira das comemorações sopramos ainda velinhas para os 25 anos da publicação de Memorial do Convento (1982) livro que tornou o escritor um nome incontornável.

Esse fato passou despercebido por nossos antenados cronistas literários, que não deram uma nota sobre o aniversário do até hoje único autor em língua portuguesa, ganhador do prêmio Nobel de literatura. E lá se vão nove anos.

Seria esse fato um simples lapso ou uma demonstração de desprezo pela obra do mais original e criativo escritor da atualidade? No Brasil, aparentemente, o autor de O Evangelho Segundo Jesus Cristo, sempre gozou de muito prestigio. Apesar de muitos críticos possuírem um olhar enviesado, para o modo pessoal e intransigente com que Saramago trata sua obra.

Saramago, por exemplo, não permite “traduções” do português, habitualmente praticado em Portugal, para o português do Brasil. Sua escrita, para preservar certa oralidade não se vale dos parágrafos e pontuações comuns em todos os textos. As falas dos personagens se entranham em meio a narrativa, distinguidas só por iniciais maiúsculas. Salvo os devidos excessos isso não é um grande empecilho a leitura de seus livros, sempre carregados de muitas reflexões sobre o mundo atual.

As queixas dos críticos contra a forma estilística adotada por Saramago não rendeu do público o mesmo espanto. Mas valeu do autor certo estranhamento de como o exame de sua obra está sendo superficial. Não raro essas querelas desviam o espírito das discussões verdadeiramente mais valiosas e tendem, erroneamente, a manter o público ainda não leitores do autor, numa distância respeitável.

Quem, no entanto, teve o prazer de lê-lo sabe que o que realmente vale em sua obra é o espírito inconteste, e permanentemente viçoso de seu questionamento à ditadura da normalidade. Suas obras alertam sempre para algo suspeitoso e fingido das instituições, dos homens, da moral e do encolhimento perante o alheio.

Saramago continua essencial e seus livros são incontestavelmente a centelha de lucidez em meio à loucura desse mundo.

Em arte toda revolta é um ato de inteligência

[Em cima: A Virgem Castigando o Menino Jesus perante três Testemunhas: A. B. (André Breton), P. E. (Paul Éluard) e o Artista (1926), de Max Ernst.]

Os primórdios do cinema



Os irmãos Lumière

Quando os irmãos Lumière transformaram uma rudimentar máquina fotográfica em uma câmara de vídeo, no final do século XIX, eles não imaginavam que estariam criando a maior invenção do século.

O cinema nascia assim, da despretensiosa curiosidade e inventividade de dois irmãos franceses, que desacreditaram desde o inicio do futuro de seu novo invento. Auguste e Louis Lumière foram os precursores, mas o cinema só passou a ser entendido como arte, quando o talento prestidigitado de Georges Méliès (1861-1938) entrou em cena.

Pioneiro na recriação de cenários, figurinos, maquiagem, Méliès, opõe-se ao documentarismo e faz as primeiras obras de ficção: Viagem à Lua, A Conquista do Pólo. Ainda, descobriu as potencialidades de (re)crição oferecidas pelo cinema. De repente, o homem passa a ser mais do que ele é mesmo e ganha os céus. As fronteiras para qualquer ação passam a ser então os limites da imaginação com que cada homem é dotado. Orientado na busca de mundos fabulosos, até então inacessíveis, o talento de Méliès, unido a invenção dos Lumière nos dar a possibilidades de romper fronteiras na exploração de novos mundos. Mas tarde passaríamos a explorarmos a nos mesmo. Tudo isso graças a uma idéia na cabeça e uma câmara na mão.

De pequenos documentários e ficções a linguagem cinematográfica se desenvolve, criando estruturas narrativas cada vez mais apuradas. Deve-se ao norte-americano David W. Griffith (1875-1948), essas inovações. Por suas contribuições ao cinema, ele é considerado o criador da linguagem cinematográfica. Griffith deu mobilidade às ações até então teatrais demais na tela de cinema. Foi ainda o primeiro a utilizar a montagem paralela, os close, que davam mais dramaticidade e suspense na hora de contar uma história utilizando-se apenas imagens.

A esses homens maravilhosos é suas máquinas devemos toda tradição do cinema. O que se produziu em seguida, as inovações posteriores, não seriam nada sem o talento, a imaginação, a criatividade e a ousadia desses pioneiros.

A IMPRENSA DESCARADA


A melhor revista brasileira em circulação, de longe é VEJA. A pior, Época. Mais uma vez essa publicação dá destaque a um funcionário, Luciano Hulk. Não bastasse Sandy e Jr., Vera Fisher etc. Só lembrando, Época pertence a Globo e já superou ISTOÉ em tiragem, mas não em qualidade. Não é uma leitura recomendável. Revista panfletária e idiota. Esse tipo de bajulação, e de notas que não são notícia, nem nada, que não interessam a ninguém que pense, não ficam a dever com essas revistas de sacanagem, de vigésima categoria.
Na semana em que morreu o ator Paulo Autran, foram anunciados os ganhadores do Nobel, “Tropa de Elite” foi sucesso antes mesmo de estrear no cimema, e, estreando, arrebentou – a capa de
Época é justamente o furto do relógio de Luciano Hulk. A quem interessa isso? Será falta de assunto? A bandidagem está aí para vitimar todo mundo. Pobre ou rico. Quem, num assalto, tem a sorte de só ser furtado deve dar graças a Deus. É o tipo de “jornalismo” oportunista, que, aproveitando de uma situação tão banal, não perde a chance de elevar a categoria social de determinadas pessoas, que pouco ou nada influenciam para a cultura do Brasil.
Triste.

Autran em seu último trabalho, "O Avarento" (Foto: Folha Online)


A CULTURA TAMBÉM COSPE

Dedico este texto a uma grande influenciadora, que já me emprestou tanto material, tanta revista.. não posso me esquecer dela, Luciene Aguiar Oliveira.
Alô? Aqui é Teo. Com esse espaço a meu inteiro dispor, é com tristeza que escrevo sobre o passamento do maior ator deste país, Paulo Autran, 85. Morreu há exatas 3 horas. Li o óbito, assinado pelo Dr. Riad Younes. Dele (Paulo) pode-se dizer o mesmo que se disse sobre um jornalista de renome da society carioca, finado Zózimo Barrozo do Amaral. O editor disse assim: “Morreu o jornalista que tratava a todos bem, mas se tratava mal”. Zózimo fumava muito, morreu de câncer. O mesmo problema de Autran. Creio que no trato pessoal, Autran tratasse muito bem as pessoas, quero dizer, o público, com sua interpretação que foi uma glória para o Brasil. Seu talento já era uma forma de cortesia para com aqueles que o valorizavam, como eu. Infelizmente, não tive a oportunidade de vê-lo representando. Paciência. A última peça dele é um texto que já li, de uma tal Edições Jakson – antiqüíssima – chamado O Avarento, comédia do francês Jean-Baptiste Molière. Foram, ao que me consta, 90 peças feitas. Participou também de um dos mais discutidos filmes brasileiros, do nosso amigo Glauber Rocha, Terra em Transe, com Danuza Leão, sra. Wainer. 1967, salvo engano (confirmem para mim, por favor). Mas suponho que ele fazia pouco da sua carreira na televisão e no cinema. Paulo Autran amava, de verdade, um palco, o que já serve de estímulo para pessoas como eu.
Não estamos em condições de perder, sem mais nem menos, gente como Paulo Autran. A cultura do Brasil já é uma coisa tão rala, tão pouca, tão... que é o cúmulo perdermos um mestre como ele. A passagem no panorama da cultura nacional, ou melhor, de um pepino que houve há mais de 40 anos, envolve seu nome.
Não foi qualquer mal-entendido. Foi uma baixaria que marcou uma geração. Ele pertencia a uma companhia, chamada Tonia-Celi-Autran, e ele não ficou prestando quando Paulo Francis começou a espinafrar por escrito d. Tonia Carrero, esposa de Celi. Isso porque Autran era extremamente ligado aos colegas, e não admitia que uma dama, uma amiga, fosse tão violentada daquele jeito. Tonia, coitada, fazer o quê? Autran, e Celi compraram a briga e o pau comeu. Os três resolveram os ataques no tapa. Paulo Autran cuspiu tudo o que tinha, na cara de Francis e jamais se falaram. O jornalista disse mais tarde, num gesto de extrema nobreza, que se arrependeu das críticas, pois elas atingiam a pessoa Tonia Carreiro e não a atriz. Na época dos artigos, alguém foi falar a Francis: “Mas, meu amigo, Tonia tem uma beleza de primeiro mundo”. De fato. Tonia era lindíssima. Francis retrucou: “Uma beleza de primeiro mundo, mas um talento de quinto”. Essa foi das menores. Só não escrevo as que eu sei aqui porque não é necessário. Igor Luzz chamaria de “constrangedor”.
Está provado então, que a cultura também cospe, provavelmente também feda, também faça xixi, também vomite tal e coisa.
Paulo Autran deixou um país mais pobre, com sua morte, e nós, amantes do teatro (do seu teatro) sentimo-nos como se estivéssemos perdendo alguém próximo a nós, um professor de cabelos já grisalhos e ranzinza, mas sempre apostando na determinação dos alunos, de rapazes novinhos, bobinhos e inexperientes de teatro, da vida e de tudo. Mas estes sempre sonhando com uma posição.
Boa noite.

POR QUE ÍGOR NÃO ME SUPORTA?

Porque ele não admite concorrência. Eu jamais – em minha modéstia – quis ser empecilho para ninguém. Nunca fui de confrontar nem de subestimar a condição intelectual do meu próximo ou do meu distante. Isso não é de meu gosto. Muito ao contrário. Quando não sei sobre determinada coisa, paro para ouvir quem sabe. Admiro quem tenha algo a passar, mas a arrogância intelectual é inadmissível sob qualquer hipótese.
O “grande gênio” – O grande problema de Igor, suspeito, é que ele sofra de complexo de inferioridade, ele deve ter algum trauma, ainda não descoberto. Daí sua necessidade de se auto-afirmar, ofendendo o outro sem dó nem piedade. Ele despreza tudo, sem ter a mais vaga noção do que se trata. Acha-se um gênio quando na verdade não passa de um cretino de botequim. Não sabe nada, não entende nada. Em minha opinião, Igor não deveria manifestar-se sobre coisa alguma. Ele cortou relações comigo (imaginem, logo eu!) porque se julgava o detentor absoluto da informação e da cultura, quando na verdade a “cultura” que ele tem qualquer pessoa também dispõe. Igor não deve ser levado a sério porque: ataca, sem nenhuma consistência autores que ele nunca leu, menospreza os verdadeiros artistas, enaltece os menores etc. etc. Esse tipo de gente, que só sabe malhar, jamais vai deixar algo que preste. Igor opinando não é boa coisa, porque seus preconceitos são potencialmente nocivos e nada do que ele diz soa como interessante. É uma pena. Igor tinha tudo para ser uma pessoa destacada, inteligente. Tem informação, mas ele não sabe como processá-las. Conhece obras-primas do cinema, mas não entende o sentido delas. Despreza produções brasileiras, sob o argumento simplório e imbecil de “tudo ó que é produzido no Brasil não presta”. Pode isso?
Em termos de arte, creio que o Brasil produziu consideravelmente. A música é o melhor exemplo. Esse coitado chamou Caetano Veloso de “ignorante”. Trata-se de, ninguém menos que o rei da música brasileira. Igor não tem a milésima parte da décima parte da cultura de Caetano. Vanessa da Mata gravou recentemente Eu sou neguinha?, anteriormente gravada por Cássia Eller. Já que você é tão extraordinário assim, meu caro e ex-amigo, desafio você a escrever qualquer coisa e dar a qualquer cantor de brega, para ver se ele grava. Estou aguardando. Você é tão extraordinário para escrever? Escreva logo o seu livro e mande para a Editora Companhia das Letras, para eu conferir se eles terão a coragem de publicar qualquer coisa sua. Igor chama as pessoas de “burras” aleatoriamente – e elas aceitam, e já me chamou de “nordestino de fé em Deus”, como se isso me rebaixasse de alguma maneira.
Eu tenho a impressão de que o conhecimento de Igor seja mesmo o de enciclopédia. Explico: A pessoa vai lá ao autor fulano de tal, lê a pequena biografia, confere a fotinha para ver se é ela mesma, tira uma citação do nada e a reproduz, dando a impressão de que leu toda a obra ou, pelo menos, todo um livro desse autor. Esse tipo de gente passa por inteligente brincando... E eu acho bom ter cuidado com elas. Perigo.
Uma das coisas das quais mais me orgulhou até hoje foi demonstrar meu conhecimento e não esconder minhas ignorâncias em determinadas coisas. Não há nada demais em não conhecer tudo. A gente vive aprendendo. Não sei quem é fulano, mas quero conhecê-lo. O imbecil não sabe, não quer saber e tem raiva de quem sabe. Igor me confunde com um deles. Eu tenho muito mais chance de crescer do que Igor por vários motivos. Primeiro: vou-me embora para Pasárgada. Vou morar numa metrópole e ter acesso a tudo. Igor vai permanecer em Vitória da Conquista, sertão da Bahia. Não creio que ele queira ir para outro canto. Tenho chances de crescer, pessoal e intelectualmente, porque oportunidades para batalhadores como eu não faltarão jamais. Igor é uma pessoa sem perspectivas, “cansada por natureza” que “cultiva o ócio criativo”. Qual criatividade tem na preguiça de Igor?, pelo amor de Deus?
Finalizando e reiterando: Igor não questiona. Igor ataca. Igor não opina fundamentando em fatos, algo com substância. Igor julga sem ter base. Critica o que conhece e o que não conhece. Algumas pessoas chamam para uma discussão, analisando o que efetivamente se verifica. Igor rebaixa. Algumas pessoas fazem críticas construtivas a alguém, para que estas cresçam. Igor humilha. Conheço autores que Igor não tem a mais vaga noção de quem sejam, e tenho a liberdade de discordar dele quando julgo necessário. Isso é independência. Não engulo as teorias burras dele e não faço concessão a ninguém que eu vejo que não merece. É por isso – só por isso – que Igor cortou relações comigo. Waaal!

O FILHO DO ANJO

A partir dessa semana Navegantes ao Mar passa a contar com a parceria ilustra de um grande amigo e dedicado companheiro. Teo, o filho mais novo de Nelson Rodrigues. Uma pena que seu pai não teve tempo de conhecê-lo, ele teria orgulho.

Sua prosa límpida e sem floreios são as marcas mais evidentes de um grande leitor. A foto acima de sua biblioteca não me deixa mentir. Apaixonado por literatura, jornalismo, artes cênicas e música ele vem somar esforços em cria um espaço para opiniões, e discussões sobre esse universo.

A leitura de seus textos pega na veia pela sinceridade e grau de informação. Ele é o que poderíamos chamar de uma pequena enciclopédia ou um almanaque. É, sem dúvidas, uma fonte de grande conhecimento para todos, que têm o privilegio de contar com sua amizade e companheirismo.

O ensaio abaixo foi só o começo. Nele já podemos perceber uma de suas inúmeras idéias fixas. Nelson Rodrigues é sua grande influência. Podemos esperar bons textos sobre esse homem tão marginalizado e ainda tão incompreendido. Teo nos dará as coordenadas para interpretação criteriosa e sem preconceitos do universo rodrigueano.

NELSON RODRIGUES: PORNOGRAFANDO E SUBVERTENDO (*)


Não vou teorizar mais sobre sua vastíssima obra e sua personalidade ímpar, já que seu nome é um dos mais folclóricos do Rio, cidade que o acolheu e assassinou seu irmão, e sim falar da paixão que sinto por ele e explico: Ninguém precisou me falar que ele era o maior teatrólogo do país. Eu mesmo descobri lendo (e relendo) suas peças. O gigantismo de sua literatura foi apresentado no 4º. e último volume do Teatro Completo – Tragédias Cariocas 2, onde o organizador, Sábato Magaldi (da Academia Brasileira de Letras), além de ter resenhado todas as peças separadamente, reuniu tudo o que se escreveu sobre a morte de Nelson, no fim do ano de 1980, menos de 15 dias depois da morte de Jonh Lennon. Apaixonei-me por todos os depoimentos – veiculados nos seus respectivos jornais – e ali reproduzidos com total exatidão – e pela forma carinhosa com que falavam sobre o morto recente e como aquela geração de brilhantes jornalistas iria sentir a falta da inteligência pulsante de Nelson. Como se acostumar, sem a força de seu talento? Um deles, não me recordo qual, disse se tratar do “maior dramaturgo brasileiro e um dos mais importantes do mundo”. Carlos Heitor Cony lembrava a dificuldade de Nelson, em seus últimos dias, de adoçar a xicrinha de café. Ele escreveu: “Como a natureza é capaz de dotar certos homens de tanta inteligência, e ao mesmo tempo dar-lhe uma saúde tão débil?” O grande Tristão de Athayde falou da inimizade que nutriram e o reencontro três anos antes. “Zuenir Ventura é testemunha do calor com que nos abraçamos. Esse foi um dos dias mais felizes de minha vida intelectual e pessoal”. De Nova Yorque, Paulo Francis dizia que “para os célebres, é bom morrer no Brasil. O morto passa a ser canonizado”. “Não temos tanta gente assim”
Persegui a vida e a obra desse homem por muito tempo e li tudo o que escreveram dele. Pesando os prós e contras, saibam que o resultado é bastante positivo. Além de brilhante teatrólogo, foi o maior cronista do cotidiano e também esportivo de qualquer época. Sobre essa última, suas hipérboles para comentar a simples atitude, a presença de um jogador no campo, são magistrais. Em 1970, a Seleção fora desacreditada para o México, depois da vergonhosa derrota em 1966. Nelson foi um profeta. “O escrete brasileiro voltará campeão do mundo”. Dito e feito. O Brasil ganhou o tricampeonato e Nelson resumiu a alma de toda uma nação vitoriosa. “Somos 90 milhões de reis. O bêbado caído na sarjeta é um rei. As datilógrafas, as colegiais, todos somos reis.”
Além disso, convém dizer que, como Shakespeare, foi um imenso poeta. Não simplesmente um escritor de fatos corriqueiros e banais. Ninguém soube separar o amor das outras bobagens, do que ele. Não interessa a ideologia. Não interessa se hoje ele pode parecer demasiado conservador. O que vale é a profundidade de seu raciocínio e suas certezas definitivas. O homem que era contra a educação sexual (“educação sexual deve ser dada pelo veterinário a bezerras, vacas, cabritas...”), contra a pílula, contra a nudez gratuita, a favor da castidade (esse que era o “grande tarado”...) afirmou, certa vez, o seguinte: “Todo amor é eterno. Se acabou, é porque não era amor. O verdadeiro amor está para além da vida e da morte. Por isso, estou certo de que a pior forma de adultério é a viúva que se casa de novo”.
_________________________________
(*) Na verdade, esse título é uma compilação de
um livro dedicado a outro grande teatrólogo
- e também maldito – Plínio Marcos, enormemente
influenciado pela obra rodriguiana.

CRÉDITO DA FOTO:

ENTRE PARES
Nelson Rodrigues (de gravata), passando o tempo com Vinicius de Moraes e Otto Lara Resende: “O amigo é um momento de eternidade”

Enquanto o nosso não vem


Dia 11, próxima terça-feira, a academia de Estocolmo anunciara ao mundo o mais novo ganhador do Nobel de Literatura. Uma das minhas próximas leituras, Philip Roth, está no pário.

Encabeçam ainda a lista Don DeLillo, Amos Oz, e o peruano Mario Vargas Llosa. Minha torcida é a favor do autor de A Guerra do Fim do Mundo.

Mario Vargas Llosa construiu uma prolífica carreira literária e uma vigorante carreira internacional. Suas atividades, no entanto, não se limitam a literatura. Em 1990 ele concorreu à presidência de seu país, mas foi derrotado, por Alberto Fujimori. Fujimori vive hoje as voltas com um processo na Suprema Corte do país, que o acusa de corrupção e abusos dos direitos humanos. Llosa vive na Inglaterra desde então.

Se levar o prêmio o peruano Mario Vargas Llosa será o quarto Sul-Americano a receber a honraria. Os outros foram: Os chilenos Gabriela Mistral, 1945, Pablo Neruda, 1971 e o colombiano Gabriel Garcia Márquez em 1982.

O Brasil ainda espera sua chance. Na década de noventa o nome do poeta João Cabral de Melo Neto esteve sempre cotado. Mais infelizmente não ganhou. O único autor de língua portuguesa a receber o prêmio é o português José Saramago, que ganhou em 1998.

ENCANTADORA SEDUÇÃO


Muitos amaram os momentos de teu alegre encanto...
William Butler Yeats



Ser linda e ganhar muito dinheiro desfilando não foram o bastante para Carla Bruni. Desde 2002 ela desfila outros dotes, não menos encantador e sedutor como os já demonstrados antes.

Ela agora fascina cantando. Seu álbum de estréia, Quelqu’un M’a Dit, um disco delicado e divinamente sussurrado em um francófono delicioso e sedutor, como vocês podem conferir aqui, tornou-se um dos álbuns mais falados em 2002.

Em 2007, Carla volta ao cenário musical com No Promises. Dessa vez juntando suas duas paixões, música e literatura, ela interpreta poemas de autores anglófonos, como William Butler Yeats, Emily Dickinson, Walter de la Mare ou Dorothy Parker.

Ainda não pude conferir o resultado. A produção cultural européia seja ela de cinema, música, literatura, demora uma eternidade pra chegar ao Brasil. As edições importadas são uma fortuna. É por isso que o mercado paralelo incha cada vez mais. Desmoralizando indústria e viciando o sistema. Assim, saem perdendo autores, fãs e a cultura.


PECADOS DO EXCESSO

Matéria do Jornal da Globo de ontem, destaca baixa expectativa de vida entre os roqueiros. Com base em uma pesquisa cientistas ingleses descobriram que a media de idade, entre os roqueiros de sucesso, não passa de 35 anos na Europa e 45 nos Estados Unidos, quando a media é quase o dobro da taxa geral da população.

O motivo: abuso de drogas, bebidas e o suicídio. As chances de morrer nos primeiros cinco anos de sucesso são maiores. A idade mais perigosa é 27 anos.

Foi com essa idade que três das maiores lendas da contra cultura morreram nos anos 60. Janis Joplin, Jimi Hendrix, e Jim Morrison o vocalista do The Doors. Ambos vitima dos excessos. Outro, que completa o rol de famosos que também morreu com essa idade, foi o vocalista do Nirvana, Kurt Cobain, que se matou com um tiro.

A funesta estatística constata que a alta mortalidade das estrelas da música acontece nos primeiros 25 anos de fama. Os que escapam a essa fase passam a viver, segundo os pesquisadores, como a maioria dos mortais. O que explica fenômenos como Mick Jagger, Rod Stewart e Ozzy Osbourne.

Ninguém sabe, no entanto, explicar como Keith Richard, guitarrista dos Rolling Stones, ainda está vivo. Conhecido pelos excessos, ele declarou recentemente que cheirou, pasmem, as cinzas de seu pai com cocaína.

A vida passa e o mundo do Rock continua produzindo suas lendas.

UM NOVO DIA


Mas aí vem.

Um outro círculo

Um outro tempo

Uma outra hora.

E o meu coração

Em prantos que hoje chora,

Amanhã

Ao nascer do dia

Ao romper da aurora.

Em viva luz

Que anuncia o agora,

Dirá adeus

Para tudo o que me devora.

FOTOGRAFIA É ARTE?


O fato de levantarmos essa questão vem de uma inquietação pessoal, até aqui não resolvida.

Sempre questionei as idéias reducionistas que tentam enquadrar o conceito de arte como um conjunto de preceitos e regras rigidamente estabelecidas; hierarquizadas por um sujeito oculto, e aceitas sem reservas por quem queira.

Essa excitação se acentuou quando discutia com um amigo o valor artístico da fotografia. Ele contestava, afirmando ser ele também um artista, se tirar fotos fosse uma forma de expressão de arte. Poor boy...

Dizia, enervado, que a fotografia não passava de um esboço pálido e inútil para atingir a arte. Caprichoso esse amigo, não?

Eu não pude concordar com ele por duas razões. Primeiro que o oficio do artista não é uma licença, concedida a esse ou aquele homem – por mais que isso hoje em dia seja a norma – e que, mesmo ele desacreditando-se como artista, eu insistia; por que não ser um com uma máquina na mão?

Segundo que para mim, o valor que cabe como critério de arte - não importam os meios - é sua capacidade de inventividade e imaginação que, toda obra artística deve incutir.

Conjugados esses elementos -inventividade e imaginação- eles serão capazes de dar forma e organização a experiências simbólica, ricamente instrutiva.

A fotografia como expressão artística, altera as aparências e reinterpreta o mundo fazendo com que percebamos tudo a nossa volta em novos termos. Dando com isso, conotações artísticas a qualquer coisa. Afinal, o que faz com que algo seja arte e não apenas habilidade é por que, e não como, tal coisa é feita. O que devemos fazer são as perguntas certas para tirarmos o conceito de arte.

A foto que ilustra esse post, do artista francês Yves Klein, é um bom exemplo do que tenho tentado mostrar, desde então ao meu amigo, como de inventividade e imaginação fotográfica. Quem ao se deparar com essa foto não se inquietará com uma situação tão insólita. Um misto de desespero e surpresa.

Por sua natureza inventiva, o toque do artista, envolve necessariamente a imaginação. Sempre que observo essa foto, penso que, a ela caberia uma epígrafe como: Quando se ama o abismo, é preciso ter assas, do filosofo alemão Nietzsche. O anseio de expressar um sentimento de liberdade, a qualquer preso, é o que move os ideais heróicos de alguns homens. A foto recria simbolicamente esse espírito irrequieto.

Que outra imagem simboliza tão completamente esse ideário de liberdade? Houve e sempre haverá novas e variadas formas de alcançar metaforicamente essa idéia. A fotografia, assim com a pintura a música o teatro a literatura, representam respostas paralelas às expressões do mundo ampliando o nosso modo de ver e compreender a realidade.


A ARTE DE BAUDELAIRE


Ontem, dia 31 de agosto, completou 140 anos da passagem do poeta Charles Baudelaire, o maior de língua francesa. Seu legado poético, eternizado em um único livro intitulado, As flores do Mal, é o testemunho de uma época de vertiginosas transformações sociais e políticas na Paris do século XIX.

Sobre ele T. S. Eliot escreveu, é o grande arquiteto da poesia moderna e de todos os tempos. Com Baudelaire a poesia torna-se o dispositivo de uma consciência crítica e nevrálgica das questões sociais, ao atingir o mais elevado grau de lucidez e plasticidade visual. Essa percepção da realidade dominará os temas de sua obra que, não se furtará a pôr em nível superior, pela graça dos elementos mais torpes, os temas menos elevados, pois: eis que (ela, a poesia) redime até a coisa mais abjeta,/ E adentra como rei, sem bulha ou serviçais,/ Quer os palácios, quer os tristes hospitais.

Tamanha impostura poética antecipará em meio século os motivos da poesia moderna. É o que entende pelo menos Ivan Junqueira quando afirma: Acima de qualquer outro, é Baudelaire que antecipa não apenas os temas, mas também todo o processo estético da poesia moderna.

Outro pólo de sua obra sem a qual não podemos entendê-lo gira em torno de sua percepção sobre o trabalho do poeta. Baudelaire está sempre aludindo seu oficio as formas de um labor constante.

Teria ele cerca de vinte anos quando começou a escrever os primeiros poemas de As flores do mal. Sem presa, seus poemas foram muitas vezes, depois de escritos, reescritos, provavelmente destruídos, fundidos, refundidos, entalhados, polidos e esmerilhado ao longo de 27 anos, durante os quais amadurece sua concepção estética, nos diz Ivan Junqueira.

Incompreendido em seu tempo, seus poemas foram proibidos de circularem, acusados injustamente de imoralidade. A 15 de junho de 1857 a 6º Vara Correcional, que tempos antes já havia condenado por mesmo motivo Madame Bovary de Gustave Flaubert, condena Baudelaire à multa de trezentos francos, e censura 6 de seus poemas a não mais serem reproduzidos na coletânea das Flores do Mal.

Reproduzimos a seguir um trecho de um dos 6 poemas censurados pela 6º Vara Correcional intitulado Lesbos. Esse nome segundo os estudiosos da obra de Baudelaire seria o primeiro titulo da coletânea de poemas que mais tarde passou a ser chamada pelo poeta de As Flores do Mal. Acreditamos que esse gesto seja a melhor forma de homenagear o poeta, nunca deixando suas flores malditas serem esquecidas.

LESBOS

Mãe dos jogos do Lácio e das gregas orgias,

Lesbos, ilha onde os beijos, meigos e ditodos,

Ardentes como sóis, frescos quais melancia,

Emolduram as noites e os dias gloriosos;

Mãe dos jogos do Lácio e das gregas orgias;


Lesbos, ilha onde os beijos são como as cascatas,

Que desabam sem medo em pélagos profundos,

E correm, soluçando, em meio às colunatas,

Secretos e febris, copiosos e infecundos,

Lesbos, ilha onde os beijos são como cascatas!


Lesbos, onde as Frinéias uma à outra esperam,

Onde jamais ficou sem eco um só queixume,

Tal como a Pafos as estrelas te veneram,

E Safo a Vênus, com razão, inspira ciúme!

Lesbos, onde as Frinéias uma à outra esperam,


Lesbos, terra das quentes noites voluptuosas,

Onde, diante do espelho, ó volúpia maldita!

Donzelas de ermo olhar, dos corpos amorosas,

Roçam de leve o tenro pomo que as excita;

Lesbos, terra das quentes noites voluptuosas,

(...)

NAVEGAR É PRECISO

Com essa pequena mudança anseio reescrever meu espaço na blogosfera. Já estou cansado de não fazer nada, quando há tanto para fazer. O primeiro passo foi mudar de ares, e como vocês podem ver de titulo. No primeiro momento “Sestro” pareceu-me adequado, pelas justificativas aqui mesmo já apresentadas.

Mas uma mudança que se queira completa, daquelas de sacudir a poeira para reiniciar ao primeiro salto, tem de ser acompanhada de uma nova proposta, e ainda uma nova cara. Por isso a imagem do mar infinito. Com isso não insinuo estar perdido, ao contrário, anuncio múltiplas possibilidade a serem alcançadas. É assim que vejo esse céu derretido. O mar é como uma estrada que leva a todos os lugares. Mesmo que se demore em algum, como Ulisses, agente está sempre percorrendo caminhos.

O visual mais sóbrio, com cores neutras, e menos aberrantes do primeiro perfil, pretende dá o tom dessa nova fase. Menos florido, mais expressão. Carregada, antes de vontade.

DEIXAR A VIDA


A MORTE

Deixar a vida,
Encontrar a morte.
É todo o destino do homem,
É sua sina
E sua sorte.

E não há ação
Que revogue do mundo,
Essa sentença
Traçada por Deus:
Em vão se apela
E sucumbe o forte

É muito, o que se faz,
Quando se lamenta.
É o bastante para saber,
Que da vida, mais uma
Corda se arrebenta.

Farmacologia Espiritual

Nos últimos dias preocupei-me cada vez mais com a queda constante de meus pêlos, por isso procurei finalmente um médico, queria saber por que pouco a pouco eu estava desintegrando.

Eu não agüentava mais as pessoas me perguntando se eu fazia a sobrancelha, e se eu tinha errado ao fazê-las. O que dizer a elas? Nem eu sabia o que havia acontecido. Recorri ao médico então.

Ele tinha a palavra final ou a trilha para encontrar minha sobrancelha. Vocês não imaginam o quanto é constrangedor ficar careca não da cabeça, mas da sobrancelha! É mais ou menos como se sentir órfão de uma parte de si mesmo, só que essa parte lhe abandona aos pouquinhos, deixando sinais de sua ausência, e os que ficam já anunciam sua partida, aterrorizando minhas esperanças de cura.

Pra me deixar mais aliviado de todo constrangimento, e de todas as dúvidas, o médico me disse que eu iria morrer. Só não soube precisar o dia nem a hora desse fato. Mas disse que iria acontecer e quando isso ocorresse, garantiu-me que eu estaria de pelugem nova.

Bastando para tanto, que eu não mais me aborrecesse com coisas pequenas e não me desse tanto ao exercício de esforços mentais, que como combustíveis, queimam e consomem uma parte de mim. Que eu me distraísse, e não me entregasse a um eu profundo e descabido, que eu vivesse pra fora e não pra dentro. Que eu batesse e não mais contesse o choro, nem me silenciasse, nem temesse os desafios, ousasse mais, e praticasse haraquiri com a sorte.

Ouvindo-o pronunciar esses conselhos pensei estar diante de um poeta e não de um médico. Mais então foi ai que me dei conta de que um e outro têm a dom da cura. O médico da carne o poeta da alma. No instante estou precisando mais da medicina. E, de agora em diante, procurarei seguir os conselhos do senhor doutor, que parece conhecer tanto do corpo humano como da farmacologia espiritual.

Ao poeta João Cabral
















João Cabral de Melo Neto nasceu em Recife, Pernambuco, em 1920. Filho e neto de donos de engenho, viveu parte da infância entre o campo e a cidade. Escreveu seu primeiro livro, Pedra do Sono, um topônimo como Brejo das Almas de Carlos Drummond de Andrade, em 1941.

Além de poeta, João Cabral foi embaixador. Serviu o Brasil em muitos países do mundo. Nenhum, no entanto, marcou tão fundo sua poesia como a Espanha.

Ao leitor acostumado com uma poesia de deslumbramento sentimental, e cunho confessional; de tradição romântica, grandiloquente, solene e cheia de pompas, nada mais estranho do que ler esse poeta.

Avesso ao confessionismo, a subjetividade, ao lirismo, que caracterizam as idéias correntes sobre poesia, João Cabral cunhou sua obra de vida palpável e dura, assim como a realidade que lhe arrebentava a retina. Sua poesia é concisa e contida no objeto. Construída sobre o signo do menos, reduz as imagens às suas formas concretas.

Sua obra mais conhecida é Morte e vida Severina (1955), ganhadora do festival de teatro de Nancy em 1966. Ainda teve uma adaptação para o cinema, com música de Chico Buarque, então um iniciante na carreira musical com 21 anos; e mais recentemente, ao completar 50 anos, ganhou uma versão em quadrinhos editada pela Massangana, da Fundação Joaquim Nabuco.

Ao ler sua obra tenho a viva sensação de estar diante de um poeta inquieto e audacioso, que fez do seu ofício uma constante busca de novas possibilidades para expressão poética. A tão falada rudeza de seus versos, talvez venha de seu zelo e temperamento, que não aceitava demagogias e facilidades literárias tão ao gosto de muitos escritores atuais. Ao não se associar a essas facilidades, teve então em curso a velha e tão batida justificativa de que tal poeta é difícil e hermético, por isso marginal.

Os que já leram sua obra sabem do que estou falando, aos que ainda não leram, não percam a oportunidade de descobrirem a inventividade desse poeta. A baixo tenho um pequeno poema que escrevi em homenagem a ele.


Todo poeta brasileiro

Que quer cantar o nordeste

Tem que saber versejar

A dura flor do agreste

Que é a poesia de pedra

De Cabral, homem da peste.


Nesse chão que é de pedra

Duro, seco e de pó.

O homem teve a coragem

De desatar esse nó,

Criando como engenheiro

A arquitetura de um só.


Pra isso, então desdenhou

Do verso, demais sem vigor,

Frouxo, ralo, aguado,

Edulcorado de amargor.

Que os líricos tomaram emprestado

Do gondoleiro do amor.


Sua poesia não é brincadeira

Pra alegrar os descontentes.

Quem tiver as suas magoas

Vá chorar em outras frentes.

Que esses versos que apresento

É de homem cabra valente.


É trabalho labutado

Na fornalha de engenho.

Corta cana, fere, mata

Da pra ver todo essa gente.

Que em cima dessas pedras

Faz brotar nova semente.


A dura flor não arrefece

Nem se deixa transbordar

É precisa, na medida,

Onde o verbo faz falar

O lamento dessa gente

Que esqueceram de calar.


Aos poetas ditos líricos,

João Cabral aconselhou.

São demais os seus lamentos,

Faz-me mau a sua dor,

Vives sempre afogado

Entre sonhos de vapor.


Vê se acorda à realidade

Não se perca em desamor.

De seu sonho de ilusão

Venha ver o meu labor,

De poeta nordestino

Cabra macho de valor.

Propósitos e explicações

Meu propósito inicial com a criação desse blog é o de dar vida a um espaço onde eu possa partilhar interesses comuns com outras pessoas. Há anos venho escrevendo diários que se silenciam nas gavetas de meu armário, ou tenho segredado coisas às paredes do meu quarto, desejando sempre torna-las públicas, afim de que elas ganhem vida própria e dialoguem com seu criador, ao menos o necessário.

Escrevendo nesse espaço tenho a chance de comungar comigo mesmo e ao mesmo tempo trocar idéias e impressões sobre literatura, música, cinema e atualidades do mundo e da minha província.

Ainda aguardo a oportunidade de fazer novos amigos, que tenham ou não os mesmos interesses literários, musicais e cotidianos. O mundo seria realmente muito chato se os interesse e gostos fossem comuns a toda gente e não houvesse o contrário, o contraditório, o conciliador, o desdenhador, o sentimental, a emotiva e as diversas engrenagens que compõem essa complexa e eficiente máquina chamada raça humana.

Ao tempo em que pesa essas confissões e desejos eu imaginava se seria capaz de dar conta de escrever diariamente. Não serei o poeta de todos os dias, porque nem todos os dias é dia de poesia, mas também não me ausentarei por longo tempo.

Outro, dos tantos propósitos desse blog, é o de impor-me uma disciplina e uma rotina no trato com as palavras. O exercício de ler e de ruminar os pensamentos literários enche-nos de um desejo incontido de ouvir nossa própria voz, mesmo que essa seja, aparentemente, rouca e gaga. De modo que assim preencho essa lacuna que há anos me domina e me obrigo a fazer o que mais quero.

O nome escolhido para o domínio desse blog, vem de um hábito que por mais que eu tente me desvencilhar não me larga nunca. A palavra sestro significa justamente isso, vício, hábito, cacoete, mania. Escolhi esse nome para me lembrar de que tenho de criar outras habilidades e esquecer, ou me livrar, das velhas e incomodas manias de sempre.

Lancei meu barco no mar e pouco a pouco dou minhas primeiras remadas.